O Corona e a Importância do SUS

02/04/2020 12:32

O Corona e a Importância do SUS

 

O mundo passa por um momento de extrema gravidade em meio à pandemia do Corona Vírus, e no Brasil a situação não é diferente. Com todas as suas dificuldades o SUS é de suma importância para o país, a História pode comprovar.

A Gripe Espanhola aterrorizou o mundo entre 1918 a 1920 matando cinquenta milhões de pessoas no mundo. Chegou ao Brasil através de indivíduos contaminados que estavam a bordo do navio Temerara, oriundo da Europa. Esse momento correspondia a I Guerra Mundial e ao final do governo de Venceslau Brás, que sofreu oposição de grupos políticos com o argumento de que eram contrários à interferência do seu governo na vida das pessoas, ou seja, eram contra medidas restritivas impostas pelos riscos da pandemia. Rodrigues Alves, aquele presidente que governou o Brasil de 1902 a 1906 – período da Revolta da Vacina e da organização do Convênio de Taubaté – foi reeleito, mas não chegou a assumir vitimado pela gripe. Delfim Moreira (vice) assumiu até que fossem feitas novas eleições e resultassem na vitória de Epitácio Pessoa que governou até 1922. Eram momentos tensos vividos pela República Velha: racha nas oligarquias, como se deu com a candidatura de Nilo Peçanha contra Artur Bernardes, além do movimento tenentista que contestava a República Velha e criticava a corrupção.

Os efeitos da crise foram assustadores e trouxeram imensas dificuldades ao Brasil. Médicos adoeceram e outros morreram, carroças carregavam inúmeros cadáveres, covas coletivas se formavam, cemitérios amontoavam-se de corpos, professores e alunos adoeciam; momentos de medo e de perplexidade. Nos jornais surgiam notícias de remédios milagrosos, um desses “remédios” seria a mistura que teria dado origem a caipirinha. Hoje percebemos esse problema com a disseminação das fake news.

Algumas medidas foram tomadas para combater os efeitos da Gripe. Ficaram proibidas aglomerações, cinemas e teatros foram fechados e aulas suspensas. No campo da economia foram ampliados os prazos para pagamentos de dívidas. Essas medidas foram criticadas por aqueles que achavam que violavam a liberdade das pessoas, posição que demonstrava o desconhecimento sobre o problema. Surgiam argumentos que atribuíam a Gripe aos interesses alemães, hoje falam de interesses chineses; criticavam a “ameaça da medicina oficial” e a “ditadura científica”. Menosprezavam a Gripe dizendo que era uma simples “limpa velhos”. Alguns trechos do artigo - Revisitando a espanhola: gripe pandêmica de 1918 no Rio de Janeiro, da mestre em História Social (UFF) Adriana da Costa Goulart esclarecem esses momentos.

 

Enquanto, na Europa, a espanhola se disseminava, no Rio de Janeiro, capital da República, as notícias sobre o mal reinante eram ignoradas ou tratadas com descaso e em tom pilhérico, até mesmo em tom de pseudocientificidade, ilustrando um estranho sentimento de imunidade face à doença. Um artigo de A Careta, n. 537 demonstra, pelo tratamento anedótico, a desinformação da sociedade sobre o problema que a ameaçava:

A influenza espanhola e os perigos do contágio – esta moléstia é uma criação dos alemães que a espalham pelo mundo inteiro, por intermédio de seus submarinos, (...) nossos oficiais, marinheiros e médicos de nossa esquadra, que partiram há um mês, passam pelos hospitais do front, apanhando no meio do caminho e sendo vitimados pela traiçoeira criação bacteriológica dos alemães, porque em nossa opinião a misteriosa moléstia foi fabricada na Alemanha, carregada de virulência pelos sabichões teutônicos, engarrafada e depois distribuída pelos submarinos que se encarregam de espalhar as garrafas perto das costas dos países aliados, de maneira que, levadas pelas ondas para as praias, as garrafas apanhadas por gente inocente espalhem o terrível morbus por todo o universo, desta maneira obrigando os neutros a permanecerem neutros.4

Medidas restritivas são vistas com desconfiança por parte das pessoas. Mesmo levando-se em consideração a crise social agravada pela derrubada dos barracos e as disputas políticas durante a Revolta da Vacina, o decreto de vacinação obrigatória despertou preconceitos e insatisfações. A I Guerra Mundial atrasou as providências de combate a pandemia, divulgar notícias e dados reais sobre a Gripe prejudicaria táticas militares.

Após as acusações de que a Santa Casa de Misericórdia (RJ) acelerava mortes para liberar leitos, surgiu a “lenda do chá da meia noite”. A crise se agravava fazendo com que governadores e prefeitos atuassem com mais força no combate contra a Gripe. Em meio à crise, o deputado Azevedo Sodré propôs a criação do Ministério da Saúde Pública. O que existia era a modesta Diretoria Geral de Saúde Pública, subordinada ao Ministério da Justiça. O que agravava os problemas de atendimento era, também, a falta de hospitais públicos, os que atendiam a parte mais carente da população eram hospitais filantrópicos que viviam de doações.

Fazendo comparações com o nosso presente e a luta contra o Corona, é inegável a importância do SUS que foi criado em 1990. Sabe-se que investir em saúde é muito caro, mas é um caminho importantíssimo para a garantia da dignidade humana e para a diminuição dos reflexos nefastos da imensa desigualdade social que afeta o Brasil.

 

Prof. Marcelo Ribeiro