Cinquenta Anos do Golpe e o Preconceito

25/03/2014 21:31


Aos cinquenta anos da implantação da ditadura militar no Brasil vemos a atuação da Comissão da Verdade e de movimentos de valorização da democracia, ao mesmo tempo que alguns poucos invocam a necessidade do retorno dos militares ao poder.

Torna-se fundamental lembrar que o Golpe de 1964 ocorreu durante a Guerra Fria, momento que existia a "grande ameaça" de implantação do comunismo. Igualmente importante foi o fato de que os militares já demonstravam interesse em comandar o Brasil desde o último governo Vargas, objetivo não alcançado graças ao suicídio do presidente. Juscelino Kubitschek, extremamente habilidoso, manteve um governo de coalizão. Jânio, personalista, não teve a mesma habilidade de JK e renunciou esperando que o povo o recolocasse no poder, avaliação equivocada. João Goulart recebeu o país em crise, sofreu forte oposição de empresários, de boa parte da classe média conservadora, do capital estrangeiro, da Igreja e dos empresários nacionais. O caminho que restou a Jango foi a definitiva aproximação com os trabalhadores e a afirmação das Reformas de Base. Naquele momento falar em reforma agrária era coisa de comunista, um argumento fácil de ser sustentado naquela conjuntura. O Golpe não foi dado exclusivamente pelos militares, lembremos do apoio do
capital externo - o Brasil foi o país da América Latina que mais recebeu dinheiro dos EUA - e do apoio dos empresários através, entre outros, do IPES e
do IBAD. Do ponto de vista da política partidária a UDN foi a base de apoio para o Golpe.

Dificilmente percebe-se, hoje, uma conjuntura favorável a qualquer movimento golpista, mesmo reconhecendo o preconceito de parte da classe média e dos ricos em relação a um governo iniciado por um operário. Não existe nem sombra do comunismo. Mesmo com a crise internacional o Brasil se mantém estável e com geração de emprego. Não há indícios que seria interessante para os EUA a implantação de um governo militar no Brasil. Dar ênfase a uma passeata de meia dúzia de pessoas que pregam o retorno dos militares serve apenas para tentar enfraquecer o governo Dilma, é uma questão meramente eleitoral. No máximo, alguns candidatos a parlamentares, com o discurso de fortalecer a segurança pública e combater a corrupção, poderiam se aproveitar dessa situação e dar uma cara mais conservadora ao Congresso. Alguns órgãos de imprensa vão ter muito trabalho ao tentar convencer a maior parte da população brasileira que o Brasil caminha para a catástrofe.
Essa mesma imprensa não tem interesse no retorno à ditadura. Ela tem sim, o interesse de eleger outro grupo político. Não caberia a igreja católica retomar
o discurso golpista. Algumas igrejas evangélicas concentram os seus ataques conservadores a elementos comportamentais e a corrupção. Mesmo assim, qual o interesse em uma ditadura? A representação dessas instituições cresce a cada eleição. O Instituto Millenium, uma espécie de IPES, tem o claro objetivo de fortalecer o PSDB, também não tem interesse em golpe. Estão tentando ressuscitar a ARENA, quem sabe disso? Tem também o Partido Militar, quem ouviu falar?

A construção da democracia é difícil, são interesses divergentes, problemas estruturais sérios e uma imprensa que noticia e comenta da forma que lhe é conveniente, que lhe interessa do ponto de vista comercial e político. Com todas essas dificuldades, a liberdade de expressão e o direito ao voto foram conquistas do povo brasileiro. Conquistas que custaram o sangue de companheiros que lutaram por um país mais justo, não cabendo qualquer espaço
para o saudosismo inconsequente da ditadura.


Prof. Marcelo Ribeiro